• Feed RSS
0
CapicSem querer adiantar o sofrimento, lembrei-me da balada que sempre acontece no fim da tarde de sábado no clube da cidade, nós vivíamos tentando entrar quando éramos menores de idade, a gente cresceu imaginando como era e o que acontecia lá dentro, acho que o que nos chamava atenção naquele lugar era simplesmente a curiosidade despertada em nós, não saber o que acontecia e o “perigo” que nos rodeava toda vez que tentamos entrar era o que nos divertia, enquanto erámos proibidos não desistimos e tentávamos todo sábado driblar a segurança, até que maiores e livres para frequentar aquele lugar nós até combinávamos, mas nunca fomos, aquilo não era mais tão interessante.
Naquele sábado eu e o João conhecemos o interior do lugar que durante muito tempo esteve presente no nosso imaginário, sabe quando você recebe um presente ainda embrulhado, fica ansioso para abri-lo e explode de alegria ao rasgar o papel e quando abre vê aquela camisa gola polo azul marinho, cor que você detesta? Pois bem, quando não podíamos entrar, aquele lugar era o presente embrulhado esperando a hora de ser aberto, e agora que finalmente entramos percebemos como é bom alongar a alegria de simplesmente ganhar o presente, realmente aquele clube não nada do que imaginávamos. Ficamos lá ouvindo uma banda muito ruim tocar até às sete da noite, quando de saco cheio dos bêbados inventando uns passos muito esquisitos e posando de rico pagando tudo, desde a bebida que consumia às cadeiras quebradas em tombos que, confesso, nos fizeram rir no inicio, resolvemos sair e fomos sentar na praça em frente ao clube, a praça estava quase vazia, na verdade além de nós dois havia apenas um casal e a garota mais chata da escola, a mais chata e mais linda também, enfim a Lila era o tipo de garota que se quer perceberia nossa presença.
- Viu a Lila? – O João tentou chamar minha atenção, quando percebeu que meus olhos não desviaram da garota.
-O quê? A Lila? Vi Sim? Mas não estava olhando para ela.
- Eu sei, você estava olhando aquele pássaro azul bonito lá atrás, não é?- O João tentou fazer piada.
- Que pássaro? Há, o pássaro? Era, bonito não acha?
- Se houvesse o pássaro azul eu até concordaria, mas não passou pássaro nenhum. Confessa, Cayo, faz tempo que eu tenho percebido uns olhares mais intensos entre você e a Lila na escola.
- Tudo bem, eu tenho olhado sim, mas ela nunca me enxergou.
- Vai lá falar com ela.
- Não, tomar um fora dessa garota em praça pública e na situação em que eu me encontro não dá.
- Realmente a praça é pública, mas não sei se percebeu, não tem ninguém aqui além de nós e aquele casal que com toda certeza está ligando muito pouco para o que acontece em volta deles.
- Você vale por mil na hora de zoar, João – Ele nunca perde a piada, e não perderia se eu tomasse o fora que ele parecia realmente não acreditar que eu tomaria.
Mesmo não indo falar com a Lila eu fui zoado, ela nunca ia querer nada comigo, da turma eu era o menos cotado para um relacionamento com ela, mas que eu queria isso eu não podia negar. Ela atendeu o celular, falou umas poucas palavras, esperou mais um minuto e um carro surgiu do nada e levou o que eu tinha visto de mais lindo naquela noite. Novamente meus pensamentos me levaram para longe da zoação do João, eu lembrei o perfume dela, não que eu o tenha sentido naquela noite, ela estava longe demais, porém aquele perfume estava gravado, na escola ela fazia questão de está sempre bem perfumada, então eu comecei a perceber que ela não me atraia apenas por ser uma menina bonita, o que eu sentia não era só a atração comum de um garoto por uma garota, mas eu não compreendi o sentimento, ela era linda, mas sua personalidade, seus comportamentos e alguns valores nos distanciavam muito. Eu quis fugir da ideia de está apaixonado.
- Ei, cara! Está tarde, vamos embora daqui a pouco é domingo, você que já está até sonhando não vai ter problema algum, mas eu estou cansado, pensa que é mole falar a noite toda com os bancos da praça?
- Já é tarde mesmo, não acredito mas talvez hoje eu encontre meus pais, é possível que eu ainda esteja acordado quando eles voltarem para casa. Nessa semana eles trabalharam dobrado.
- É possível?
- Parece que é, impossível para eles é ser pai e mãe.
O João nunca deu opinião quando eu falava dos meus pais e isso me fazia bem, ele sempre foi ótimo ouvinte e as vezes melhor que alguém que fale é quem nos deixa falar. Com João era assim, pelo menos quando se tratava do meu relacionamento com meus pais. Exaustos fomos para casa, o caminho silencioso explicitava as horas avançadas, nós não nos esforçamos para violá-lo.
Cheguei em casa e como esperava meus pais ainda não haviam chegado, fui deitar agora o que não saia da minha cabeça era a menina linda que até a noite de hoje era apenas a patricinha bonitinha da escola.